Quando se é pequeno, não sei por
qual motivo, há uma ingenuidade de acreditar que se você pensar direitinho,
planejar meticulosamente seu sonho antes de dormir, ele acontecerá naquela
noite. Pode ser porque às vezes ele mostra coisas que você fez no seu dia, que
seu cérebro ainda está ativo naquele pensamento, e você acaba sonhando. Então,
eis a estratégia “milenar” que o faz pensar que comanda seus sonhos, ou seus
pesadelos, quem sabe?
No entanto, após você crescer e
prestar o mínino de atenção nas aulas de biologia – chato, mas precisa prestar
-, confirmará que foi enganado durante muito tempo, que aquela história de
pensar no sonho é pura bobagem. E você fica chateado, mas supera numa boa, sem
traumas (pelo menos pra mim não teve problema).
Antigamente, eu tinha o hábito de
rezar e pensar nos meus sonhos antes de dormir. Hoje, rezo esporadicamente
(tudo bem, Deus não me ama menos por isso), e nunca mais pensei no que sonhar.
Tanto faz se eram sonhos ou pesadelos, tinha outras coisas melhores para gastar
meu tempo. Perdi esse hábito há muito tempo, há anos...
Recentemente, numa noite linda, em
que eu não planejara nada para sonhar, tive o sonho mais belo do mundo. Eu
estava na casa em que passei boa parte da minha infância, na casa da minha tia,
que fica em Belém - PA. E permaneci com a mesma idade que tenho agora, mas a
casa ainda tinha o mesmo formato da época em que vivia nela, e o mais
importante: ainda tinha uma pessoa que morava lá.
Ele estava no sofá, e quando o vi
fiquei emocionada. Lembro que disparei em direção a ele para abraçá-lo,
beijá-lo e dizer repetidamente: “Eu te amo! Eu te amo muito!”. Ele sorria e
retribuía meu carinho, dizendo assim: “Eu também te amo muito! Amo você e sua
mãe!”. Eu não me contentava de tanta alegria, estava completamente estonteante.
Até que ele me pediu licença, e disse que iria a barbearia cortar seus cabelos
grisalhos. Eu o deixei ir, infelizmente. No final do sonho, eu estava com
minhas malas prontas para voltar à Macapá, e esperava ansiosamente que ele
voltasse da barbearia para que eu pudesse me despedir. Ele não chegava. No
fundo do meu coração eu senti que não iria mais vê-lo, então resolvi esperá-lo,
mesmo que isso custasse a perda do meu vôo. Sentei no sofá e esperei,
esperei... Num determinado momento, ouvi um estrondo que não vinha daquela
sala. Acordei espantada! Uma pessoa aqui em minha casa fez um barulho grande,
sem querer, que me despertou. Quando vi que aquilo não era realidade, fiquei
muito triste, muito chateada por não ter conseguido me despedir. Depois, eu
pensei: “Será que eu conseguiria dizer adeus?”.
Contei o sonho para minha mãe, ela
ficou muito feliz! Eu passei boa parte do meu dia pensando em como seria se ele
estivesse comigo durante todo esse tempo. O quanto ele ficaria orgulhoso em
saber que passei no vestibular, que estou seguindo meus estudos. E pensei no
futuro, também. O quanto ele ficaria feliz ao comemorar comigo meu primeiro
emprego, meu casamento, meu filho (seu bisneto favorito, quem disse que não?).
Sei que ele não conseguiria dar umas porradas nos homens que me passaram a
perna, mas contratar um assassino de aluguel com certeza passaria pela sua
cabeça. Por que não?
Ri. Chorei. Ri novamente. Chorei de
saudade. Esse foi, sem dúvida, o melhor sonho que poderia acontecer e que eu
jamais imaginaria. Repito mais uma vez, vovô: “Eu te amo! Eu te amo muito!”.
“Que lindo que é sonhar
Sonhar não custa nada
Sonhar e nada mais
De olhos bem abertos
Que lindo que é sonhar
E não te custa nada mais que tempo...”
(À noite sonhei contigo – Paula Toller).